Manaus de Milton Hatoum: G1 faz guia com 10 'cenários' de obras do autor
Dizem que ler um livro é viajar sem sair de casa. Para quem vive em Manaus - cidade que completa 347 anos nesta segunda-feira (24) -, essa máxima é comprovada ao abrir qualquer obra de Milton Hatoum, autor amazonense que fez de sua infância na capital inspiração para uma premiada carreira literária. O G1 preparou um guia para os fãs do escritor com dez locais que ilustraram obras como “Relato de Um Certo Oriente” e “Dois Irmãos”.
VEJA FOTOS DOS LOCAIS CITADOS PELO ESCRITOR
Divulgação / Aen)
Obrigatório em diversos vestibulares desde que foi lançado em 2000, o romance “Dois Irmãos” encanta e leva o leitor a uma Manaus ainda não tomada pela expectativa da Zona Franca. A ditadura militar é o pano de fundo para a história dos gêmeos Omar e Yaqub.
Uma dinastia onde todos os membros da família de Omar e Yaqub desempenham papel importante, “Dois Irmãos” é uma viagem sensorial a uma cidade pelo olhar da comunidade árabe.
Na primeira fase da história, por exemplo, o leitor conhece um Mercado Municipal bem diferente do que foi reaberto em 2013.
patrimônio arquitetônico da cidade (Foto:
Leandro Tapajós/G1 AM)
"No Mercado Municipal, [Galib] escolhia uma pescada, um tucunaré ou um matrinxã, recheava-o com farofa e azeitonas, assava-o no forno de lenha e servia-o com molho de gergelim."
(Dois Irmãos, página 36)
Outro cenário de histórias de Hatoum é o Teatro Amazonas. Em “Dois Tempos”, conto de “A Cidade Ilhada”, o protagonista e narrador vai com o tio assistir a um recital da professora, a Dona Steinway.
Amazonas (Foto: Camila Henriques/G1 AM)
"Tio Ran apontava o nome dos músicos, poetas e dramaturgos europeus: os artistas mais famosos do mundo estavam ali, nos estandartes de gesso em forma de lira, encardidos e empoeirados (...). Quando o pano de boca subiu, o piano preto do conservatório apareceu no centro do palco."
(A Cidade Ilhada, páginas 54 e 55)
A casa de espetáculos é uma das protagonistas de outro conto de “A Cidade Ilhada”, intitulado “A Ninfa do Teatro Amazonas”. A história descreve com riqueza de detalhes cada canto do teatro centenário. O Largo São Sebastião, que rodeia o prédio, também faz a sua participação na história. Uma das descrições mais belas de Hatoum é em "Cinzas do Norte", onde ele fala sobre o monumento da Abertura dos Portos para o comércio estrangeiro, no meio do Largo.
do Largo São Sebastião em Manaus (Foto: Leandro
Tapajós/G1 AM)
"Ao lado de uma moça, ele mirava a nau de bronze do continente Europa; olhava o barco do monumento e desenhava com uma cara de espanto (...). Parei parsa ver o desenho: um barquinho torto e esquisito no meio de um mar escuro que podia ser o Rio Negro ou o Amazonas."
(Cinzas do Norte, página 8)
Hatoum fez do Cemitério São João Batista pano de fundo para uma das passagens de “Uma Carta de Bancroft”, mais um conto de “A Cidade…”. Uma carta do escritor Euclides da Cunha ao colega Alberto Rangel é desmembrada nestre trecho.
Leandro Tapajós/G1 AM)
"Ele se aproxima de militares que acompanham um féretro. Não sabe por que o caixão está aberto (...). O defunto com feições indígenas era inesquecível porque era o rosto de um herói."
(A Cidade Ilhada, página 23)
O Hotel Amazonas, localizado na Avenida Eduardo Ribeiro, é um dos cenários de “Dois Irmãos”. Yaqub visita Manaus e vai uma banquinha de tacacá perto ao hotel com Nael, o narrador da história.
em Manaus (Foto: Leandro Tapajós/G1 AM)
"Ele parou diante da banquinha de tacacá da Dona Deúsa, tomou duas cuias, sorvendo com calma o tucupi fumegante, mastigando lentamente o jambu apimentado, como se quisesse recuperar um prazer de infância."
(Dois Irmãos, página 85)
O igarapé do Educandos é citado em mais de uma obra de Hatoum. Em “Relato de Um Certo Oriente”, livro vencedor do primeiro prêmio Jabuti do amazonense, o local era mais um dos ‘ouvintes’ do narrador da história, que discorria sobre os passeios matinais de Emir.
Educandos (Foto: Leandro Tapajós/G1 AM)
"Também não entendia o passeante solitário que de manhãzinha deixava o hotel Fenícia, acordava um catraieiro na beira do mercado, e na canoa os dois remavam até a outra margem do igarapé do Educandos."
(Relato de Um Certo Oriente, página 56)
Os cinemas antigos de Manaus hoje são uma miragem em forma de prédios comerciais ou até mesmo abandonados, mas quem cresceu entre as décadas de 1940 e 1980 lembra bem das matinês no Odeon, Eden e Guarany, entre outros. Essas salas foram citadas por Hatoum em suas obras - um exemplo veio na coletânea de contos "A Cidade Ilhada".
Pedrosa (Foto: Camila Henriques/G1 AM)
"O Tarso era o mais triste e envergonhado: nunca disse onde morava (...). Raro sair com a gente para um arrasta-pé (...). Um cineminha, sim: duas moedas de cada um e pagávamos o ingresso do Tarso. E íamos ao Eden, Guarany ou Polytheama."
(A Cidade Ilhada, página 8)
Alguns locais viram personagens de obras literárias. No caso de Hatoum, um desses é, definitivamente, a Igreja Nossa Senhora dos Remédios, localizada na rua Leovegildo Coelho, no Centro de Manaus.Em "Relato...", a igreja era quase que uma extensão dos sentimentos de Emilie.
Tapajós/G1 AM)
"Emilie parava de viver cada vez que o eco quase imperceptível das badaladas da igreja dos Remédios pairava e desmanchava-se como uma nuvem sobre o pátio onde ela polia os anjos de pedra após extrair-lhes o limo e os carunchos acumulados na temporada de chuvas torrenciais"
(Relato de Um Certo Oriente, página 30)
Outro local importante em uma obra de Hatoum é a rua dos Barés em "Dois Irmãos". O bar Maloca dos Barés era um dos pontos de encontro dos manauaras nos anos 1940, com shows e, no livro lançado pelo amazonense há 16 anos, é citado amplamente.
Leandro Tapajós/G1 AM)
"'Sou filho do Halim.' 'O da rua dos Barés? Minha Nossa Senhora... Aquele menino? Olha... como cresceu! Espera um pouco.' Ela trouxe uma fotografia em preto e branco: Yaqub e minha mãe juntos, numa canoa, na frente da palafita, o Bar da Margem."
(Dois Irmãos, página 86)
No entanto, poucas passagens são tão lembradas pelos fãs do livro quanto o desfile de Yaqub como espadachim. O "evento" aconteceu em plena Eduardo Ribeiro.
do Centro de Manaus (Foto: Leandro Tapajós/G1 AM)
"As mulheres da casa se assanharam para admirar o espadachim. Madrugaram na avenida para conseguir um lugar próximo à passagem das bandas e pelotões. Levaram chapéu de palha, suco de abacaxi e uma sacola cheia de tucumãs. Esperaram três horas sob o sol forte de setembro."
(Dois Irmãos, página 31)
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