Após aprender inglês por fita, homem viaja mundo e diz já dominar 7 línguas
Sair pelo mundo com uma mochila nas costas conhecendo culturas diferentes é o sonho de muita gente. O amazonense Ailton Ferraz Vieira, de 52 anos, descobriu cedo uma maneira de conhecer lugares, pessoas e ainda ajudar nas economias de casa. Filho de um serralheiro e de uma dona de casa, aos 9 anos ele começou a estudar inglês sozinho, por meio de fita cassete e livros, em casa, na canoa dos pais ou onde mais pudesse se encostar e focar no aprendizado.
Aprender um novo idioma é um desafio para muitas pessoas.
Aprender sete, ainda por cima, sozinho, parece ser uma tarefa muito maior. Ailton diz ser fluente em inglês, espanhol e francês, mas também consegue se comunicar em alemão, japonês, italiano e swahili - um dos idiomas oficiais do Quênia e Tanzânia.
Colômbia (Foto: Arquivo Pessoal)
Nascido em Itacoatiara, a 176 km de Manaus, Ailton conta que desde cedo, ele e os seis irmãos ajudavam os pais no trabalho. Algumas vezes ele vendia cestos nos barcos que chegavam com turistas e assim teve contato com idiomas além do português.
"Meu pai, com o pouco conhecimento que tinha de geografia, me explicou que o pessoal do navio morava longe do Brasil, que falava outro idioma, tinha outra cultura. Falei que queria aprender inglês e ele economizou um pouco do dinheiro e comprou algumas fitas cassete com aulas de inglês. Quando voltava da escola eu me trancava no quarto e passava horas decorando e repetindo as frases", relembra.
A dedicação em aprender o idioma rendeu a Ailton certa discriminação por parte dos amigos, que muitas vezes diziam que ele estava apenas perdendo tempo e aprender outro idioma não o levaria a nada. "Ficava na calçada da escola com o gravador, caminhava com os livros, eles riam de mim, mas não liguei, continuei aprendendo. A vantagem é que naquele tempo não tinha eletricidade em casa, então em vez de jogar bola ou correr na rua, eu estudava", recorda.
Há 23 anos, Ferraz mora em Winnipeg, no Canadá. Lá, ele mora com um casal de filhos e a esposa. Ele mantém um escritório onde vende passeios turísticos, trabalha como segurança em uma emissora de rádio e televisão e faz trabalhos para organizações sem fins lucrativos. A fotografia também é uma de suas paixões e área de atuação. No Brasil, ele trabalhou como ajudante de pedreiro, assistente de contador e guia turístico em excursões pelos rios do Amazonas, onde conheceu a esposa canadense.
Ailton acumula viagens por várias partes do mundo, muitas delas feitas com a esposa. "As viagens começaram assim que conheci minha esposa. Ela é canadense e estava viajando pela América do Sul. Lembro que saímos em um motor de linha [embarcação] de Manaus até Tabatinga, de lá atravessamos para Letícia para tirar o visto e entrar na Colômbia. Passamos vários dias no barco comendo galinha cozida e café com bolacha. Esse era o cardápio. De Letícia fomos para Bogotá, Equador e Venezuela", conta.
"De uma viagem de barco começaram as aventuras. Um novo mundo se criou dentro de mim. Comecei a ter novas experiências e queria continuar fazendo isso. Gostei demais. Acho que criei um tipo de personagem dentro de mim. Senti que depois da viagem podia cuidar de mim e da minha namorada, agora esposa. Viajar tirou completamente o medo de deixar meu país, minha família e minha casa para começar as minhas aventuras pelo mundo", afirma.
O desprendimento rendeu ao casal viagens a países como México, Costa Rica, Turquia, Rússia e Quênia, além de muitas histórias. Porém, uma em especial marcou a vida do casal: a viagem em um veículo Colt velho, com "algumas partes coladas com fitas adesivas", pelos Estados Unidos.
"Depois de conhecer alguns países da América do Sul decidimos um dia viajar pelos EUA num carro Colt velho. Dava medo de usar o carro, mas decidimos ir. Tenho uma amiga no Colorado e fomos visitá-la. Essa foi uma das viagens que mais marcou minha vida junto com a minha esposa. Lembro que viajamos por uma plantação de milho em Chicago ouvindo a banda Creedence Clearwater Revival. Conseguimos ir e voltar pra casa do Colt velho e logo depois da nossa volta para o Canadá vendemos o Colt por 50 dólares. Já viajamos em uns 15 países, mas temos planos de ir em mais", almeja.
Dedicação
O foco que o guarda, guia, voluntário e fotógrafo teve para aprender o inglês sozinho quando criança, o fez estudar todos os outros idiomas falados nos locais para o qual viajou. Além de estudar idiomas, Ferraz estuda fotografia, o que segundo ele, é importante para aprimorar o estilo fotográfico.
"Minha mãe apontava o dedo para o meu caderno com dever de casa e dizia: "capricha nos teus estudos que vão te servir mais tarde". Mesmo sem tê-la do meu lado e não poder vê-la jamais repetindo esse gesto, ainda "capricho" nos meus estudos. Não importa a idade, ainda me sinto um menino lutando pelos meus objetivos e só vou envelhecer quando parar de lutar pelos meus sonhos. Aí sim, meus estudos e conquistas não me servirão mais de nada. Jamais quero desapontar minha doce mãe onde quer que ela esteja nesse momento. Foram meus estudos que abriram as portas para um mundo de aventuras e me levou a fronteiras de lugares que nunca imaginava conhecer", reconhece Ailton.
Dicas de mochileiro
A experiência de Ailton mostrou que um dos principais fatores para fazer uma boa viagem é conhecer o idioma. Porém, os costumes e festividades também são importantes para se adaptar ao local, segundo o mochileiro.
"Por exemplo, em Cuba tem vários festivais musicais onde se comemora também o dia da revolução Cubana. Entretanto, não se fala de religião nem tampouco se vê gente carregando a bíblia pela rua ou pregando o evangelho nas esquinas. As pessoas gostam de falar de Che Guevara e do que aconteceu no dia da revolução. Não falam de comunismo ou socialismo, mas gostam de falar de seus ídolos", apontou.
Ailton também recomenda pesquisa sobre a religião e os feriados religiosos da nação que será visitada. Em uma viagem pela Turquia, o amazonense aprendeu isso na prática ao passar pelo Ramadan - mês no qual os muçulmanos praticam jejum ritual.
"No Ramadan, as pessoas ficam em jejum durante o dia e a comida só pode ser servida depois do pôr do sol. Em alguns bares só é permitido vender água e não álcool. Pra quem mora no Canadá, como eu, tive muito que aprender com os turcos sobre a importância de conhecer um feriado religioso", ressaltou.